Colapso na saúde: a diálise não pode parar, mas o que pode parar a diálise?


Mais de 140 mil brasileiros dependem da diálise pelo SUS: colapso no sistema pode ser fatal para quem tem doença renal
avançada. (Foto: Frank Merino/Pexels)

 

Há décadas, clínicas enfrentam um cenário de financiamento insuficiente, agravado por inflação, aumento dos custos operacionais e ausência de políticas estruturantes.

No Brasil, cerca de 175 mil pessoas dependem da diálise para viver — 79% delas são atendidas pelo SUS. Agora, essa crise ameaça atingir um novo patamar. Um colapso com data marcada e consequências imediatas para mais de 140 mil brasileiros.

A partir de 31 de julho de 2025, as unidades de diálise em todo o país poderão enfrentar um aumento expressivo de custos com a possível extinção do Convênio 01/99 — que há mais de duas décadas garante isenção de ICMS sobre medicamentos e insumos utilizados na diálise.

O fim dessa política, somado à defasagem dos valores pagos pelo SUS, tornaria inviável a operação de muitas clínicas, especialmente nas regiões mais vulneráveis.

Desde o início do ano, a Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), junto a outras entidades, tem se mobilizado para evitar essa tragédia anunciada. Em março, foi enviada uma carta aberta ao Ministério da Saúde. Em abril, à SEFAZ. Ambas sem resposta. O tema foi pauta de debate em sessão no Congresso Nacional, promovido pela Frente Parlamentar da Nefrologia, em alusão ao Dia Mundial do Rim.

O que está em jogo é a continuidade de um tratamento vital. Sem a diálise, pacientes com doença renal crônica em estágio avançado não sobrevivem por mais do que alguns dias.

A não renovação do Convênio 01/99 representaria um impacto financeiro no setor estimado em cerca de R$ 1 bilhão por ano, com aumento médio de 23,7% nos custos dos procedimentos. Em troca, os estados arrecadariam pouco. Pagariam caro, em vidas humanas.

O que pode parar a diálise? A resposta, infelizmente, não está na medicina. Por um paradoxo cruel, a máquina segue funcionando, mas o sistema está prestes a falhar. Ironicamente, não é a doença que ameaça a vida de milhares — é a iminente omissão do Estado. 

Manter o tratamento desses pacientes é um compromisso com a vida, com a dignidade humana e com o que está escrito na Constituição Federal. O Brasil não pode permitir que uma mudança tributária, associada à negligência orçamentária, leve à morte de seus cidadãos mais vulneráveis.

O colapso está anunciado. Se, ainda assim, nada for feito, não será por falta de aviso.

José A. Moura Neto é presidente da Sociedade Brasileira de Nefrologia.

 

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